Drogas no Brasil: uma política à beira do retrocesso
“A política atual
fracassou e o que estão fazendo no Brasil é simplesmente dar um passo atrás
enquanto todo o mundo está buscando soluções inteligentes”. Foi assim que o
ex-presidente da Colômbia, César Gaviria, resumiu as ações do governo
brasileiro em relação ao uso de drogas no País.
O tema foi objeto de
palestras durante o Congresso Internacional sobre Drogas: Lei, Saúde e
Sociedade (CID 2013), que levou 700 de pessoas ao Museu na República, em
Brasília, com o objetivo central de repensar o rumo dessa política no Brasil. O
evento reuniu representantes do governo, da
sociedade civil, de instituições de ensino, estudantes e entidades ligadas ao
tema. Diferentes nações, como Portugal e Uruguai, já aprovam reformas legais
descriminalizantes em relação ao uso de drogas.
No ano 2000, pesquisa
realizada em Portugal mostrou que as drogas simbolizavam o maior problema do
país. Em 2001, o governo português ousou, com um sistema comandado pelo
Ministério da Saúde, excluindo internações
compulsórias e repressão milita do rol dos tratamentos destinados a usuários.
Em 2011, a investigação foi repetida e o uso de entorpecentes não constavam
sequer na lista dos dez maiores problemas locais.
No Brasil, o cenário é bem
diferente. Entre várias medidas, alguns estados, sobretudo São Paulo e Rio de
Janeiro, têm implementado uma política de combate ao crack fundada em internações
compulsórias e involuntárias, mesmo com posicionamentos contrários de
entidades, grupos, movimentos sociais e populares, em todo o Brasil, que
ressaltam implicações das medidas do ponto de vista ético, jurídico e político.
Um dos mais respeitados
médicos do mundo sobre o tema, o húngaro-canadense Gabor Maté, que participou
do Congresso Internacional sobre Drogas, estima que a cada 100 pessoas que
experimentam crack, aproximadamente 20 fiquem dependentes. O crack é mais viciante
que a maconha (9%) e menos do que o tabaco (32%), a taxa mais alta entre as
drogas. A cura, segundo ele, não engloba cadeia, internação forçada ou
ampliação das penas para usuários de drogas, e sim algo mais simples, como a
solidariedade e a compaixão – ações que as ajudem a encontrar sentido para as
próprias vidas. “A dependência não reside na droga – ela reside na alma”,
afirmou.
No Brasil, o Projeto de
Lei (PL) 7.663/2010, quer alterar os dispositivos da lei sobre drogas. A
proposta apresentada pelo PMDB-RS teve o texto-base aprovado pelo plenário da
Casa em 22 de maio. Ela segue, agora, para avaliação pelo Senado Federal. O
projeto prevê a internação involuntária de dependentes por até 90 dias,
solicitada por um familiar ou por servidor público que não seja da área de
segurança pública, e aumenta a pena mínima do traficante de cinco para oito
anos de cadeia.
O diretor fundador da Drug
Policy Alliance (EUA), Ethan Nadelmann, esteve no CID 2013 e se mostrou
bastante desanimado com os rumos da política de drogas brasileira. “O Brasil
insiste em seguir as pegadas de políticas americanas falidas, encarcerando
pessoas nos presídios ou em centros de tratamento compulsório. Não há nenhuma
prova de que essa seja uma política eficiente”, disse. “O governo brasileiro,
que tenta tanto descriminalizar a pobreza, não leva em conta que não há nada mais
eficiente em criminalizá-la do que estes programas”, completou.
O aumento das penas
mínimas de cinco para oito anos para traficantes é outro alvo de críticas em
relação ao projeto. “É mais do que o tempo previsto para homicídio”, considera o
ex-secretário nacional de Justiça e professor da Universidade de São Paulo
(USP), Pedro Abramovay. De acordo com ele, a lei não esclarece o limiar entre
usuário e traficante. “Quando colocados na mesma situação, o pobre é traficante
e o rico, usuário”, comparou.
O professor da Universidade de São Paulo (USP),
Henrique Carneiro, frisou a falta de amparo científico na discussão em torno da
política de drogas. “O PL leva em conta uma espécie de ascensão ao domínio da
sociedade brasileira de uma vertente fundamentalista, sem embasamento teórico,
que tenta criar um pânico moral, fazendo da palavra droga um espantalho”,
destacou.
FONTE: Jornal do Federal - CFP
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