sábado, 23 de junho de 2012

O Berço Vazio




“É hora de dormir. Mariana, de cinco meses, se aloja na cama da família. Antes de embalar no sono, ela estica as mãozinhas para tocar a mãe, Simone, que está ao seu alcance. Durante a noite, gosta de fazer carinho no pai.”

O fragmento acima, copiado de um jornal de circulação nacional, aponta com maestria para o que considero o verdadeiro problema dessa nova tendência. Colocar o bebê na cama dos pais é muito mais prático: facilita a vida. No entanto, colocar o bebê na cama dos pais, é transformar a “cama do casal” em “cama da família”.

Teoricamente, a diferença pode parecer sutil, mas na prática é devastadora para a relação erótica do casal. Ter um bebê na cama dos pais é acabar com a possibilidade de qualquer gesto de erotização entre o casal nos momentos que antecede ao sono. É abrir mão de um espaço que deve ser constantemente preservado, o espaço da intimidade do casal.

Pessoas apaixonadas gostam de dormir juntas, de dividir a mesma cama. Quando estamos namorando, desejamos ardentemente o momento de compartilhar os travesseiros com o nosso parceiro. A intimidade criada pelo ato de dormir junto, quando há amor, é a certeza que vivenciamos com a pessoa amada um momento único.

Um filho transforma um casal em uma família, ou seja, em uma estrutura maior. Com a chegada dos filhos, as relações afetivas tornam-se mais complexas. O casal – esposa e marido – assume a responsabilidade afetiva de ser mãe e pai. Num passado não muito distante, a chegada dos filhos marcava o fim do espaço romântico. Os pais deviam priorizar os deveres e responsabilidades de suas funções.

É claro que amamos muito os nossos filhos, mas esse amor não tem uma conotação romântica. O amor romântico é um amor erotizado. Ninguém espera viver um romance com um amigo, com o pai ou com a mãe.
Preservar o momento de intimidade do casal é um modo de lutar pela felicidade e, muito provavelmente, pela manutenção da família. Como não existe nenhuma pesquisa que tenha comprovado que crianças que dormem na cama dos pais, no futuro, serão mais felizes, mais inteligentes, mais calmas ou qualquer outro mais. A única coisa absolutamente certa é que colocar os bebês a dormir na cama dos pais, dá menos trabalho. Mas, atenção, nem sempre o caminho mais fácil é o melhor dos caminhos.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Aromas da Mudança


Vivemos nas primeiras décadas do século 21 um momento de ruptura, onde aspectos básicos das relações humanas estão sendo reformulados.  As formas tradicionais de relacionamentos não estão dando mais respostas satisfatórias e, com isso, se abre um espaço para descobrir novos modos de viver as relações. Essas mudanças, como todo processo de mudança, geram dúvidas e incertezas. Não se quer repetir os padrões antigos, mas teme-se a instabilidade dos novos modelos.

O novo é sempre assustador, nos faz sentir desprotegidos, por isso nos agarramos ao já conhecido. Imaginem que se, nas primeiras décadas do século XX, alguém dissesse que as separações seriam corriqueiras e que as garotas não se casariam virgens. Por certo, as pessoas ficariam muito indignadas com tal possibilidade.

Hoje, a mulher pode não só dividir o poder econômico com o homem, como decidir ter filhos se quiser ou quando quiser. Uma escolha que as personagens de Jane Austen, no século XVII, jamais imaginaram poder fazer. A total dependência econômica e moral, das mulheres daquela época, interditava completamente a liberdade de escolha.

O enfraquecimento dos valores que sustentaram a ideologia patriarcal traz novas reflexões sobre o relacionamento entre homens e mulheres: o amor, o casamento, a sexualidade. O aroma dessas mudanças influência nossas escolhas. Pressentimos a destruição de valores estabelecidos como inquestionáveis e nossas convicções mais enraizadas são abaladas. Os modelos do passado não nos dão mais respostas e nos deparamos com uma realidade ameaçadora, por não encontramos modelos em que nos apoiar, em tempo algum, em nenhum lugar.

Entretanto, essa pode ser a grande saída para novas conquistas, quando perdemos um pouco do medo das mudanças. Não tendo mais que se adaptarem a modelos arcaicos, as singularidades encontram um novo espaço de expressão. No momento em que se rompe com a moral que, durante tanto tempo e através de seus códigos, julgou e subjugou o prazer, abre-se um espaço onde novos modos de vida, assim como novos desejos, podem ser experimentados.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

As Instâncias do Medo



O medo, a princípio, é um sentimento de defesa e proteção. Portanto, um sentimento positivo, aliado da luta diária pela sobrevivência. O medo como ferramenta de proteção tem um objeto bem definido. Sentimos medo de pessoas, animais e situações que não podemos controlar, e que, por isso mesmo, colocam em risco a nossa sobrevivência.

Mas existem outros tipos de medo. Medos mais difíceis de conviver e de admitir sua existência. Temos, por exemplo, medo de ser feliz e, simultaneamente, medo que a felicidade acabe. Temos medo da dor. Medo de perder. Medo de recomeçar. Medo de estar sozinhos, e medo de ter alguém. O medo, para muitos, parece ser o sentimento mais constante e mais intenso.

Para os que vivem constantemente sob a sombra desse sentimento, o medo de perder é o que mais paralisa. Para esses, o encontro amoroso pleno torna-se um pesadelo. Logo depois da euforia dos primeiros encontros, aparece uma estranha inquietação, acompanhada de uma melancolia vaga e indefinida. Surgi à sensação que alguma desgraça está a caminho, aproximando-se a passos largos, e que é impossível preservar por muito tempo tamanha felicidade.

Numa estranha lógica, nasce a suspeita de que coisas dolorosas e frustrantes têm mais chances de aparecer quando se está feliz. O perigo parece crescer proporcionalmente à alegria. E, pouco a pouco, a sensação de plenitude vai cedendo espaço a apatia, ou pior, ao pânico.

Algumas vezes, a escolha de parceiros inadequados é uma maneira de reduzir os riscos de uma hipotética tragédia. Um jeito de apagar a chance de ser feliz. Cria-se uma dor menor com o objetivo de se proteger de uma suposta dor maior. Outras vezes, a proteção ao medo é construída na desvalorização do parceiro. Ao elevar os pequenos defeitos do outro àa categoria de grandes problemas, cria-se uma zona de instabilidade externa que serve de proteção à instabilidade interna.

O medo é um sentimento que não podemos eliminar de nossas vidas. Como disse no início, ele é uma ferramenta de proteção. Portanto, o medo de perder existe em todos nós.  Só não podemos deixar que ele se transforme num antídoto da felicidade. Afinal, uma coisa é certa, felicidade não atrai tragédias.