terça-feira, 28 de agosto de 2012

As dificuldades de não ser convencional.



Felicidade e liberdade são valores, ou estados emocionais, que buscamos alcançar desde muito cedo. Mas, desde o momento que tomamos consciência que os nossos desejos, necessidades e prazeres são diferentes dos desejos, necessidades e prazeres dos nossos pais, ou de qualquer outra pessoa, percebemos, também, que a felicidade e a liberdade só serão alcançadas a partir de nossas próprias escolhas.

Consequentemente, não é a toa que esses valores são tão difíceis de alcançar. Fazer as próprias escolhas e responsabilizar-se por elas, assim como, sustentar os nossos desejos, não é trabalho fácil. Temos que lutar contra o temor do desafeto e das represálias em geral, ao qual estão sujeitos todos os indivíduos, que não se comportam conforme os padrões usuais e tidos como aceitáveis, pela sua família e grupo social. Se os nossos desejos não correspondem ao desejo do grupo em que estamos inseridos, se não somos tão convencionais como o esperado, a possibilidade de não ser amado é grande. E, não ser amado é uma sanção quase insuportável para qualquer ser humano.

Para sermos amados por nosso grupo familiar, teremos de agir de acordo com seus valores.  Porque, sabemos, cada pessoa toma a si próprio como um modelo de perfeição a ser proposto especialmente para os filhos. Mesmo que a própria pessoa possa se sentir brutalmente infeliz e insatisfeita. O egoísmo narcísico sustenta-se na lógica da repetição do mesmo.

Sair desse impasse, não é uma tarefa fácil. Como ser feliz sabendo que nossas escolhas não são respeitadas por aqueles que amamos? Como encontrar forças para ir atrás dos nossos sonhos, quando eles não são compartilhados por aqueles que esperávamos ser apoiados? O sentimento de solidão e de exclusão, nesses casos, faz com que muitos optem pelo caminho mais tranquilo. Ou seja, alienar-se ao desejo do outro.

Seguir por um caminho já traçado, parece ser o mais fácil. Nele corremos menos riscos. Afinal, ele foi projetado por aqueles que vivem repetindo que desejam a nossa felicidade “acima de tudo”.  Como bons meninos(as) seremos admirados e invejados pelos nossos pais e nossos pares. Porém, sentiremo-nos profundamente infelizes e profundamente solitários, apesar de termos feitos todas as concessões para evitar essa dolorosa sensação de abandono.

Maria Holthausen

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

A Elegância como Gesto




Acabei de ler um pequeno texto, de 2004, do saudoso Daniel Piza, sobre a elegância. Piza começa o texto afirmando que, nos tempos atuais, a deselegância está na moda. E, porque a moda é a deselegância, costumamos menosprezar a elegância como um atributo de superfície.

Não é nada disso - assegura Piza, sobre o preconceito contemporâneo desse tão saudável e esquecido modo de relacionamento social. A elegância é o reconhecimento de que há potenciais campos de consenso entre os seres humanos e, logo, a forma de busca-los – nem que seja para descartá-los – tem de ser transparente e proporcional.

 A elegância, continua Piza, é um modo de manter a sobriedade sem cair na frieza; de aceitar a complexidade da realidade, mas não se conformar com a pequenez; de ser claro, para resistir tantos aos eufemismos como às hipérboles. É a arte de dizer muito em pouco, de adensar sem adornar, de simplificar para não banalizar. É ser incisivo, sem ser inconsequente. É não pendurar no pescoço uma cartaz que diz ¨Olha como sou fashion!¨, mas também não é ser tão discreto que se fala sozinho.

Esquecidos do valor moral desse modo de relação social, costumamos associar à elegância ao estar bem vestido ou ao estar com o corpo “em forma”. Ou seja, associamos elegância a uma imagem e não a um gesto.   O texto de Daniel Piza nos faz redescobrir a elegância do gesto, do ato, da ação: um modo elegante de se relacionar com o outro.

Um modo de relacionamento onde, por exemplo, a sinceridade não seja sinônimo de agressividade ou depreciação do parceiro. Onde o amor pelo parceiro, ou pelos filhos, não seja sinônimo de posse. Onde a luta pelo espaço profissional leve em conta a condição humana de incompletude.

Ser elegante é antes de tudo saber olhar para o outro com humanidade. E nunca perder a perspectiva que dentro desse caldo chamado “humanidade”, somos todos iguais, porque somos todos mortais.      


Maria Holthausen 

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Lei Maria da Penha



Neste mês comemora-se seis anos da Lei Maria da Penha. A lei que criminalizou a violência contra as mulheres. A promulgação da lei foi importante, nem tanto pelos seus efeitos legais, mas por seus efeitos psicológicos na sociedade. Antes dessa lei, percebíamos a violência contra as mulheres como algo comum entre alguns casais. Era, antes de tudo, um problema do casal. Só quando essa violência transformava-se em homicídio é que a justiça entrava em ação.

Sob o efeito da lei, percebe-se que o problema não é do casal, mas da família. Toda a família sofre as consequências desses atos agressivos. Os filhos levarão por toda a vida a memória dessa violência. Os meninos, a partir do exemplo do pai, podem ser tornar adultos violentos. As meninas, num movimento simbiótico com a mãe, procurarão, mesmo sem ter consciência dessa procura, maridos agressivos, repetindo a história da mãe.

Ao perceber que a violência ultrapassa as fronteiras do casal, espalhando seus efeitos por toda a família, as mulheres se sentem mais livres para lutar pelos seus direitos. Antes, era muito comum que a mulher se sentisse responsável pela violência do companheiro. Se ela apanhava era porque, de algum modo, merecia apanhar. Essa culpa causava muita vergonha e ela tinha grande dificuldade em buscar ajuda.

Buscar ajuda não é só ir a uma delegacia fazer um BO. A justiça inibe a violência, mas não resolve a gênese desse comportamento. Comportamentos agressivos são construídos ao longo de uma vida, e não serão resolvidos através da punição judicial. Homens violentos precisam de tratamento psicológico, tanto quanto uma pessoa viciada em droga. 

Por isso, é preciso que as mulheres, parceiras da violência, tenham consciência que a justiça vai ajuda-las no momento de crise. Mas a solução do problema virá através de um trabalho terapêutico. Esse processo pode começar com uma terapia de casal. O terapeuta irá escutar a dinâmica da violência no casal e poderá intervir no sentido de desconstruir essa dinâmica.

A terapia, de casal ou individual, é um processo bem menos doloroso que a prisão. E que, por certo, trará benefícios bem mais profundos para todos os envolvidos.
 
Maria Holthausen

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O Parceiro Narcisista




Pessoas com traços narcisistas dificilmente estão envolvidas com seus parceiros. Embora pareça ao contrário. A princípio, são fáceis de amar porque são muito sedutoras, charmosas e detalhistas. Geralmente são intuitivas, sabem detectar o que agrada o outro e investem sua sedução nestes pontos.

No entanto, à medida que a relação avança, o parceiro começa a perceber que as manobras de sedução escondem uma enorme frieza emocional, uma grande intolerância à crítica e uma necessidade exacerbada de admiração. São exigentes ao extremo. Têm ciúmes de tudo e de todos. São aquelas pessoas que têm ciúmes “até da própria sombra”.

Outra característica importante do narcisista, que o parceiro vai ter que conviver, é a egolatria: sensação de grandeza. Ele sabe tudo: eu sei, eu faço, eu aconteço; são seus mantras. Por consequência, suas necessidades são sempre prioritárias. A necessidade do outro vem depois, ou pior, são desvalorizadas.

Qualquer crítica que se faça a sua conduta responde com fúria cega, porque o outro não reflete o que ele espera. E se o parceiro tenta falar sobre as suas necessidades e frustrações, o narcisista, com sua lógica imbatível, vai levar a discussão por um caminho que lhe seja bastante satisfatório. Afinal, para o narcisista, é o parceiro que deve ajustar suas expectativas na relação. As dele, sempre estiveram muito claras, e são muito justas.

Se você tem um parceiro narcisista, seguramente tem sofrido as consequências da egolatria, e da frieza emocional, dessa pessoa. E se mesmo assim continua na relação, é porque ainda está seduzido pelos traços encantadores desta pessoa. Afinal, nos encantamos com os narcisistas porque, na maioria das vezes, são pessoas muito bonitas. Mantem um cuidado constante com a aparência, e são encantadores socialmente. E, acima de tudo, são pessoas muito seguras e determinadas.

Quem é o parceiro ideal do narcisista? A pessoa que tem dificuldade em ser amada. Por causa dessa característica, ela é muito mais motivada a dar amor do que receber amor. Quando essa dupla se encontra, a química é perfeita: um ama dar amor, o outro, ama ser amado.

Maria Holthausen