segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Filho Único



Você me quer?
Você cuida de mim?
Mesmo que eu seja uma pessoa egoísta e ruim?

Você me aceita
E me dá a receita
De como conviver com um monstro mesquinho e careta?


Você me respeita
Não grita comigo
Mesmo que eu tente tudo pra te irritar


Você tem que entender
Que eu sou filho único
Que os filhos únicos são seres infelizes


Eu tento mudar
Eu tento provar que me importo com os outros
Mas é tudo mentira (tudo mentira)


Estou na mais completa solidão
Do ser que é amado e não ama
Me ajude a conhecer a verdade
A respeitar meus irmãos
E a amar quem me ama

Cazuza e João Rebouças

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

QUASI



Arrumar a vida, pôr prateleiras na vontade e na acção...
Quero fazer isto agora, como sempre quis, com o mesmo resultado;
Mas que bom ter o propósito claro, firme só na clareza, de fazer
qualquer coisa!

Vou fazer as malas para o Definitivo,
Organizar Álvaro de Campos,
E amanhã ficar na mesma coisa que antes de ontem - um antes de
ontem que é sempre...

Sorrio do conhecimento antecipado da coisa-nenhuma que serei...
Sorrio ao menos; sempre é alguma coisa o sorrir.

Produtos românticos, nós todos...
E se não fôssemos produtos românticos, se calhar não seríamos nada.

Assim se faz a literatura....
Coitadinhos Deuses, assim até se faz a vida!

Os outros também são românticos,
Os outros também não realizam nada, e são ricos e pobres,
Os outros também levam a vida a olhar para as malas e arrumar,
Os outros também dormem ao lado dos papéis meio compostos,
Os outros também são eu.
....

Fernando Pessoa, in: Ficções do Interlúdio

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Amores Obsessivos


Imagine que você não consiga pensar em nada que não tenha relação com determinada pessoa. Seu desejo e desespero são tão intensos que se aproximam da dor física. A ausência do ser amado o impele a escrever páginas e páginas de cartas e a discar seu número de telefone várias vezes ao dia. Por vezes, sentindo que está abandonado ou que ninguém dá atenção à sua dor, é compreensível que surjam ódio e planos de vingança. Em princípio, isso pode parecer apenas sinal de um comportamento irracional demonstrado por uma pessoa apaixonada que não é correspondida. Algo que, de acordo com senso comum, vai passar com o tempo. Mas e se esses sentimentos e comportamento persistirem? E se as tentativas de participar da vida do ser amado se tornar cada vez mais exageradas e agressivas?

O fenômeno da perseguição excessiva ganhou atenção da mídia apenas a aproximadamente 20 anos, devido a alguns casos de assédio a famosos. Psicólogos e psiquiatras, porém, conhecem essa ameaça há mais tempo: no século XIX, um dos pais da psiquiatria forense, Richard von Krafft-Ebing, já escrevera sobre mulheres com fixação obsessiva que viajavam atrás de atores que idolatravam. Nos anos 80, a erotomania foi classificada como distúrbio psíquico. Quem sofre dessa patologia parte do princípio irremovível de que é amado pela outra pessoa, mesmo que não haja nenhum motivo para que chegue a essa conclusão. O esforço incessante de entrar em contato com alguém é considerado uma das principais características da erotomania. Para abordar esse comportamento costuma-se usar a expressão em inglês stalking, um termo relacionado à caça, que indica uma forma sorrateira de se aproximar da presa.

Da mesma forma, um stalker cerca sua vítima e procura não perdê-la de vista. Mesmo diante da rejeição explícita, ele insiste na aproximação: seja por telefone, carta, e-mail ou diretamente. Alguns enviam presentes ou objetos bizarros, às vezes assustadores, como colagens de fotos com caveiras no lugar dos rostos. Por vezes, fazem encomendas em nome da pessoa que perseguem, simplesmente com a intenção de difamá-la. Um em cada cinco stalkers se torna agressivo em algum momento, podendo voltar-se violentamente contra a vítima, seus parentes próximos ou conhecidos ou mesmo seu animal de estimação.

Embora as motivações amorosas dos stalkers sejam as mais frequentes, os perseguidores não se restringem a elas. Podem ser movidos, por exemplo, pelo desejo de vingança. Ex-parceiros íntimos, em geral, representam o maior e mais perigoso grupo de stalkers. Alguns deles têm autoestima instável, mostram indícios de distúrbios de personalidade narcisista ou borderline, mesmo que não tenham recebido esses diagnósticos. A maioria dos ex-parceiros perseguidores sabe que é malvista pelos seus atos. No entanto, para eles isso ainda é melhor do que serem ignorados.

O que leva uma pessoa a ter esse comportamento? Pesquisas recentes revelam que esses sujeitos tem uma percepção bastante distorcida: apesar de suas tentativas de aproximação não terem sucesso, quatro em cada cinco perseguidores declararam que queriam continuar no encalço. O motivo mais alegado por eles foi o fato de estarem ligados ao outro “pelo destino”. Um terço dos entrevistados estava convencido, de forma onipotente, de que devia superar a resistência de sua vítima, pois ela própria, no fundo, queria isso. Outro terço sentia-se obrigado a cuidar da pessoa amada. Essas declarações trazem uma evidência: quem entra na mira de um stalker pode rejeitar as tentativas de contato seja o quanto for – o ofensor não aceitará as recusas.

Diferentemente de pessoas que sofrem por eventos pontuais, as vítimas de stalking se confrontam de forma constante com o objeto de seu medo. Às vezes, são obrigadas a lidar com seus torturadores no dia a dia. Se o telefone toca, pensam automaticamente que pode ser o perseguidor. Nessa atmosfera de medo e perplexidade, esquecem o que é ter uma vida “normal”.

Parte do artigo "Amor Obsessivo", publicado na Revista Mente&Cérebro.


quarta-feira, 11 de agosto de 2010

CONVITE



Caros amigos,

Quero convidá-los para o concerto que acontecerá nesta sexta-feira - dia 13 - às 21:00h no Teatro Pedro Ivo Campos. No programa, o concerto Tríplice de Beethoven (assim chamado por ter três solistas junto à orquestra - no caso: piano, violino e violoncelo) e minha mais nova composição: um concerto para piano, violino, viola e orquestra sinfônica. O título dessa obra é Aurora consurgens, alusão a um antigo tratado alquímico (cada um dos quatro movimentos representa uma das fases da alquimia: Nigredo, Albedo, Citrinitas e Rubedo). O violinista, o violista e o violoncelista vieram da Itália especialmente para participar desse evento, são excelentes musicistas (tocam na Sinfônica de Roma).

Nas duas obras farei a parte do piano, e a regência será do maestro Jeferson Della Rocca.

Espero que possam vir.


Um grande abraço,
Alberto Heller


segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Alegria, Alegria: Por que não, por que não...


"Quando nos concentramos em alcançar o nebuloso objetivo da felicidade, uma noção abstrata, que envolve uma série de acontecimentos e realizações para ser mensurada, estamos nos esquecendo de buscar algo bem mais próximo, que é alegria. Essa nossa preocupação com felicidade reflete a diminuição das oportunidades para a alegria coletiva real experimentada por variedades de dança que vemos hoje nas ruas."

Barbara Ehrenreich, em
 Dançando nas Ruas -
Uma História do Êxtase Coletivo,
Editora Record


quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Somos nossos próprios demônios



Uma força precisa arrasta minha linguagem para o mal que posso fazer a mim mesmo: o regime motor do meu discurso é a roda livre: minha linguagem aumenta de volume, sem nenhum pensamento tático da realidade. Procuro me fazer mal, expulso a mim mesmo do meu paraíso, me empenhando em procurar em mim imagens (de ciúme, de abandono, de humilhação) que me podem ferir; e, aberta a ferida, eu a sustento, e a alimento com outras imagens, até que uma outra ferida venha desviar a atenção.

Roland Barthes - Fragmentos de um Discurso Amoroso

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Estabilidade ou chance de crescer?



Uma das maiores riquezas do ser humano é a diversidade. Somos diferentes e buscamos a realização profissional de diferentes formas. Mesmo assim, é preciso não esquecer que frustrações e insucessos fazem parte de qualquer caminho profissional ou afetivo.
Optar pela segurança de um emprego público pode parecer uma atitude pouco ambiciosa para pessoas com perfil mais empreendedor. No serviço público, embora o risco de demissão seja muitíssimo menor, o risco de uma vida profissional inteira dependendo de gestores em cargos comissionados com enorme poder sobre a sua carreira é um risco que não pode ser ignorado.
No entanto, nem todas as pessoas são felizes sendo cobradas por resultados trimestrais e vivendo as vicissitudes da instabilidade do jogo de mercado. Pois, optar por uma carreira com menos garantias significa assumir certo grau de risco e apostar em suas competências pessoais para realizar suas conquistar e traçar o seu próprio rumo.
Portanto,  a escolha é sempre singular. Você deve questionar qual é o seu perfil profissional e adequá-lo a sua escolha. Afinal, como diz o poeta, “cada um sabe a dor e a delicia de ser o que é.”