terça-feira, 27 de agosto de 2013

Memória Afetiva: Re-Memórias



A memória é sempre inventiva e infiel. O passado que volta à consciência é apenas o reflexo remoto de uma realidade perdida para sempre, uma realidade que captamos inevitavelmente deformada através do filtro de nossa percepção atual. Esse é o motivo pelo qual a recordação de nosso passado é apenas o fruto de uma ilusória reconstrução. Quando pensamos, por exemplo, na casa de nossa infância, sempre a imaginamos imensa, mas, voltando lá, decepcionamo-nos com suas modestas dimensões. A casa que o garotinho deixou não é mais a mesma aos olhos do homem maduro que ele se tornou. Assim, o presente opera como uma lente deformadora do passado. Portanto, toda recordação é, necessariamente, o resultado da reinterpretação subjetiva de uma realidade antiga, e nunca sua evocação fiel. Não existe passado senão remodelado e recriado à luz de nossa percepção presente. É por isso que diremos que a recordação não é o passado, mas um ato do presente, uma criação do presente.

J.D. Nasio 

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Flores Raras ... e Banalíssimas





Estreia "Flores Raras", de Bruno Barreto. O filme - baseado no livro "Flores Raras e Banalíssimas", de Carmen L. Oliveira -nova edição pela Rocco - conta a história dos 17 anos (mais ou menos) que Elizabeth Bishop passou no Brasil.



Na sua chegada ao porto de Santos, em 1951, Bishop já era uma poeta reconhecida, "poet laureate" dos EUA. Nota: "poet laureate" é um cargo de poeta oficial nacional, que raramente me desapontou. Carol Ann Duffy, uma de minhas poetas preferidas, ainda é "poet laureate" do Reino Unido; Billy Collins e Louise Glück foram "poet laureate" dos Estados Unidos, sem contar Robert Frost e Joseph Brodsky. Aliás, eu descobri Collins e Duffy quando se tornaram "poet laureate" de seus países.



Enfim, Bishop estava circum-navegando a América do Sul; viajando, ela queria aliviar sua melancolia. Como Robert Lowell lhe diz lindamente no filme: ela procurava a "cura geográfica". Em Santos, a poeta desceu do barco com a ideia de passar uma semana ou duas visitando uma amiga, Mary Morse, que era então a companheira de Lota de Macedo Soares.



À primeira vista, o encontro de Elizabeth Bishop e Lota não foi muito promissor. Aos olhos de Lota, maravilhosamente interpretada ou inventada por uma inesquecível Glória Pires, Bishop devia parecer como uma chata, por grande poeta que fosse. E é provável que Bishop se assustasse pela presença expansiva de Lota. Agora, uma sugestão: é sempre bom desconfiar dos outros ou outras que seu parceiro ou parceira acha imediata e excessivamente desinteressantes.



De qualquer forma, o encontro de Elizabeth e Lota foi o começo de uma relação que é, para mim, um protótipo de história de amor que vale a pena. Alguns dirão que não acabou bem. Mas esse não é um argumento. O que importa mais é que, nos anos em que elas se amaram, cada uma delas deu o melhor de si: Bishop escreveu os poemas de "North and South" (que lhe valeram o prêmio Pulitzer), e Lota concebeu e realizou o aterro de Flamengo, no Rio de Janeiro.



É frequente que, num casamento, o cônjuge, por adorável que seja, apareça como alguém que limita nosso desejo -às vezes, ele, de fato, compete com nossa vida e domestica nossos sonhos. Esse não foi o caso de Elizabeth e Lota: cada uma potencializou o gênio da outra -essa é uma flor rara.
Detalhe crucial, "Flores Raras" não é um filme sobre um amor homossexual, simplesmente porque o fato de que se trata de duas mulheres é indiferente -o espectador não tem nem tempo nem disposição para aprovar ou para recriminar o amor de Elizabeth e Lota.



Talvez, na sociedade privilegiada e culta do Rio de Janeiro dos anos 1950-1960, pouco importasse que Lota e Elizabeth fossem duas mulheres. Não sei. O fato é que Bruno Barreto conseguiu contar a história de Lota e Elizabeth de tal forma que o gênero e a opção sexual das amantes é muito menos importante do que o amor entre elas.



Ontem, em São Paulo, no "Fronteiras do Pensamento", palestrou Anthony Appiah (professor em Princeton, autor de "O Código de Honra", Cia das Letras). Numa entrevista a Cassiano Elek Machado, na Folha de 10/8, Appiah menciona a revolução moral recente pela qual "há 20 anos, a maioria das pessoas (nos EUA) diria que a ideia do casamento gay é totalmente ridícula. Hoje, se você falar com jovens americanos, 70% deles vão defender sua aprovação".



Pois bem, "Flores Raras" não precisa caber num catálogo de "filmes homossexuais" porque cabe no dos grandes filmes de amor e porque já pertence a uma época em que a orientação sexual talvez seja, enfim, inessencial.



Não me lembro de um momento de minha vida (sequer a infância) em que a orientação sexual fosse, para mim, um fato relevante. Um pilar de minha educação moral foi minha avó, que era católica devota e moralmente preconceituosa, mas dotada de senso prático -se eu fosse homossexual, ela provavelmente se tornaria antipapal (talvez anglicana) na hora.



O outro pilar foi meu pai, para quem a própria ideia de "anormalidade" era uma bizarrice. Embora fosse especialista, tinha uma prática de médico de família: de manhã, ele visitava seus pacientes a domicílio. Quando eu estava de férias, ele pedia que eu o acompanhasse. Dizia que era para lhe fazer companhia. Suspeito que ele quisesse me ensinar a reconhecer meus semelhantes na diversidade do mundo, das casas, dos quartos e das vidas. Enfim, divago. Não perca "Flores Raras".

Contardo Calligaris
Jornal Folha de São Paulo



sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Fragmentos



A tarefa da psicanálise é se ocupar do inconsciente 

quando o inconsciente nos faz sofrer, isto é, quando a

defasagem entre o que somos e o que nos escapa nos

tornam infelizes. 



J.D. Nasio - Um Psicanalista no Divã



terça-feira, 13 de agosto de 2013

Dicas para uma boa apresentação



Apresentar trabalho, seja como aluno ou como profissional, tornou-se uma prática corriqueira. Afinal, vivemos em uma sociedade marcada pelo avanço da tecnologia visual. Uma tecnologia que nos permite tirar fotos ou fazer filmes em qualquer momento do dia.


No entanto, uma coisa é preparar a apresentação das fotos do final de semana ou das férias para mostrar para os amigos ou familiares. Outra, muito diferente, é apresentar para um grupo, com ajuda de imagens, nosso ponto de vista sobre uma teoria ou um produto.


Praticamente todas as apresentações têm como objetivo levar pessoas a aderir a algo: pode ser uma ideia, um produto, um conceito ou mesmo uma mudança de comportamento. Para alcançar esse objetivo a apresentação – texto e imagens - deve ser conduzida por uma história coerente, bem estruturada e atraente, capaz de despertar e manter a atenção da audiência.


A sua maneira de pensar e de construir uma apresentação profissional tem mais a ver com a sua idade e com a sua geração do que você imagina.


Executivos da geração X e anteriores tendem a optar por um tipo de construção distinto dos profissionais da geração Y. É claro que não é algo tão engessado assim, mas as diferenças são geralmente visíveis.



E embora os profissionais mais jovens estejam mais identificados com o novo modelo, mais atrativo e com mais recursos visuais, as duas gerações têm pontos fortes e fracos na hora de elaborar suas apresentações. Confira:





Pontos Fortes da geração X e anteriores


1. Conhecimento aprofundado
“A geração X tem a questão de ir atrás do conhecimento, porque antigamente se alguém queria entender alguma coisa tinha que conversar com uma pessoa que soubesse ou se aprofundar nos estudos”.
São pessoas que apresentam conhecimento embasado e mais aprofundado sobre temas, o que reflete positivamente na hora de elaborar uma apresentação.

2. Calma e segurança
O pensamento é mais racional e a pressa é menor. Por isso, a dedicação com que os profissionais da geração X trabalham uma apresentação traz segurança tanto na hora de elaborar o material quanto no momento da apresentação. 



Pontos fracos da geração X e anteriores

1.  Muito texto, pouca imagem
Essa geração não tem muita facilidade visual, usam e abusam dos bullet points.  Ausência de recursos visuais pode deixar a apresentação pesada e nada atrativa para quem a vê.

     2. Pouca abertura para novas ideias
    Há um risco de achar que sabe tudo sobre o tema. O excesso de segurança pode atrapalhar na hora de o profissional se abrir para novas ideias. E na hora de transmitir este conhecimento, há o perigo de nem sempre levar em consideração a bagagem dos ouvintes.
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     Pontos fortes da geração Y e futuras
1. Bagagem mais visual e criativa
É uma geração que sabe lidar com a imagem e com a fotografia. Por isso, apostar em recursos visuais definitivamente é um ponto forte das suas apresentações.
2.   Agilidade na hora de buscar conteúdo

O acesso à informação é pleno. Os jovens da geração Y sabem onde encontrar o que precisam e não têm dificuldade em lidar com as novas tecnologias. Já nasceram com essas ferramentas, por isso a facilidade. A facilidade de encontrar conteúdo permite que os jovens tenham maior poder de análise crítica. São pessoas que não acreditam em tudo que elas veem.

Pontos fracos da geração Y e futuras

1.   Superficialidade
É simples e rápido buscar e encontrar textos, imagens, filmes, conteúdos para a apresentação. O desafio é fazer a curadoria para extrair o que é relevante. O imediatismo dos jovens atrapalha na hora de se aprofundar sobre os temas.

2. Excesso de informações desconectadas
Outro pecado cometido pela geração Y na hora de organizar uma apresentação é o excesso de informações. É tão fácil conseguir conteúdo que os profissionais podem cair nesta armadilha de ir colocando conteúdo sem que ele esteja amarrado. O problema é transformar a apresentação em um grande “Frankenstein” de conteúdo.


FONTE: Site Revista Exame


quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Os Assexuados: Uma Vida Sem Sexo



Nem gays, nem héteros, nem bissexuais. Eles simplesmente não gostam de transar. Homens e Mulheres que não sentem desejo, defendem a abstinência e lutam para ser reconhecidos como uma nova orientação sexual.



Michael Doré tem 28 anos e nunca beijou. Nem pretende. Beijos, carinhos e qualquer forma de contato íntimo lhe causam repulsa. “O sexo me enoja”, diz ela. “Sou um assexual convicto.” É quase impossível imaginar que um cara como ele, charmoso, bem-sucedido — é um matemático norueguês e PhD da Universidade de Birmingham, na Inglaterra —, sequer pense em transar. Ainda mais nos dias de hoje, em que sexo e orgasmo são quase uma obrigação. E, antes que alguém pergunte o que há de errado com Michael, ele mesmo responde: “Não, não sou gay, não fui abusado na infância, nem tenho problemas hormonais. Eu simplesmente não gosto de transar”.

Assim como ele, a pedagoga mineira Rosângela Pereira dos Santos, o bancário americano Keith Walker e uma legião de assexuados dos mais diferentes cantos do planeta começam a sair do armário. São homens e mulheres de todas as idades, perfeitamente capazes de fazer sexo, mas sem nenhum gosto pela coisa. Gente que, graças ao apoio da Aven (Asexual Visibility and Education Network), rede que luta pela visibilidade dos assexuados no mundo, conseguiu se unir para levantar a bandeira da abstinência e lutar para que a assexualidade seja reconhecida como uma quarta orientação sexual (além de héteros, homos e bissexuais).
 
Sob o slogan “It’s o.k. to be A” (algo como “tudo bem ser assexuado”), esse grupo tem frequentado as passeatas gays de Nova York, São Francisco, Londres e Manchester. No grupo, lutando contra o preconceito em relação aos que não gostam de transar, há desde aqueles que nunca tiveram uma relação sexual na vida, até os que fazem sexo por obrigação, para não perder o parceiro.

 “Por assexual entende-se apenas aquele que não sente atração sexual, não o que não é capaz de se envolver”, explica a socióloga Elisabete Oliveira, que fez do assunto tema de seu doutorado na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. “Existem os assexuais românticos e os não românticos. O primeiro grupo consegue se apaixonar, casar e até ter filhos — desde que não haja sexo envolvido. O segundo não gosta de carinhos e não se sente apto a se apaixonar.”



Na França, no dia 24 de abril de 20913, aconteceu (na internet) a primeira jornada dos assexuados. Um movimento que há anos, segundo o jornal Libération, junta, cada vez mais, sujeitos que se declaram pertencentes a uma sexualidade “sem sexo”.

O fenômeno merece atenção, haja vista que se torna uma palavra de ordem para 1% dos sujeitos do planeta que atestam esta nova identidade. Em nome do “respeito” devido a cada ser humano, esta nova denominação quer se fazer reconhecer, em sua diferença, como um “quinto gênero” (LGBT mais assexuados) que têm o “direito” de existir.

A blogueira e jornalista Peggy Sastre, autora do No Sex, avoir envie de ne pas faire l’amour, (No sex, vontade de não fazer amor). Defende que na assexualidade não se trata nem da abstinência do lado religioso, nem da recusa, do corpo enquanto tal, mas uma reivindicação de que se possa, de que se tenha o direito de não ter vontade… de fazer amor, como o título de seu livro indica. São sujeitos que «preferem não».

FONTES: Site: Instituto Adé Diversidade
Site: Escola Brasileira de Psicanalise