quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

A promessa de aprender a arte de amar


Meus fragmentos de um discurso amoroso:

 Aprender: Pode-se aprender a desempenhar uma atividade em que haja um conjunto de regras invariáveis correspondente a um cenário estável e monotonamente repetitivo que favoreça o aprendizado, a memorização e a manutenção dessa simulação. Num ambiente instável, fixar e adquirir hábitos – marcas registradas do aprendizado exitoso – não são apenas contraproducentes, mas podem mostrar-se fatais em suas consequências. O que é mortal para os ratos dos esgotos urbanos – aquelas criaturas inteligentíssimas capazes de aprender rapidamente a distinguir comidas de iscas venenosas – é o elemento de instabilidade, de desafio às regras, inserido na rede de calhas e dutos subterrâneos pela “alteridade” irregular, inapreensível, imprevisível e verdadeiramente impenetrável de outras criaturas inteligentes – os seres humanos, com sua notória tendência a quebrar a rotina e derrubar a distinção entre o regular e o contingente. Se essa distinção não se sustenta, o aprendizado (entendido como a aquisição de hábitos úteis) está fora de questão.

.... A promessa de aprender a arte de amar é a oferta (falsa, enganosa, mas que se deseja ardentemente que seja verdadeira) de construir a “experiência amorosa” à semelhança de outras mercadorias, que fascinam e seduzem exibindo todas essas características e prometem desejo sem ansiedade, esforço sem suor e resultados sem esforços.
Zygmunt Bauman

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Um ponto de partida na luta contra a depressão



Sem dúvida que um dos grandes problemas da depressão é a perda de qualidade de vida – os sintomas como desânimo, tristeza e irritação frequente afastam os depressivos do convívio com as pessoas, reduzem suas interações sociais e até seu nível de atividade geral. Obesidade, insônia e dores pelo corpo são apenas alguns dos sintomas que se seguem desse quadro.
Um estudo recente mostrou que atividades físicas, mesmo as recreativas, podem reduzir o risco dos sintomas da depressão na vida dos pacientes. Acompanhando a saúde de mais de quinze mil pessoas no Canadá, os pesquisadores se focaram naqueles que tinham boa qualidade de vida, observando o que poderia colocar tal qualidade em risco. Evidentemente a depressão era um fator de risco importante. No entanto, quando as pessoas faziam alguma atividade física, mesmo que sem grande intensidade, o risco diminuía em 70%. Por outro lado, o sedentarismo aumentava em 40% o risco de perder qualidade de vida em pacientes deprimidos.
Segundo a pesquisa, tanto os exercícios leves como os moderados, se feitos diariamente, funcionam tão bem quanto à inclusão de uma nova droga ao tratamento.  Caminhar, andar de bicicleta, passear com o cachorro, nadar: em qualquer dessas atividades a regularidade é fundamental. Afinal, independente da melhora clínica dos sintomas, manter a qualidade de vida já é um grande passo no combate à depressão.

FONTE: Patten SB, Williams JV, Lavorato DH, & Bulloch AG (2013). Recreational physical activity ameliorates some of the negative impact of major depression on health-related quality of life. Frontiers in psychiatry, 4 PMID 



quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Noites de alface... Boa Leitura!



Acabei de ler Noites de alface, de Vanessa Barbara. Adorei a linguagem dessa jovem autora.  Sua visão do mundo se dá de forma tão aguda que o real e o absurdo transformam-se num par perfeito. Cativante, tocante, engraçado: esses são ótimos adjetivos para o livro.


Pequeno fragmento do livro Noites de alface...

Otto sempre tivera dificuldade para pegar no sono, ao passo que Ada já caía no estágio REM antes mesmo de pousar a cabeça no travesseiro. Insônia, para ela, era passar cinco minutos rolando na cama, remoendo um crime hediondo que acabara de cometer. “Se você matasse um inocente com uma tesoura sem ponta, tipo um negócio sangrento, psicologicamente exaustivo, e tivesse que passar a vida enganando a polícia e fugindo de um fantasma raivoso, ainda assim demoraria só uns vinte minutos para dormir. No máximo”, argumentava o marido. Para Otto, insônia era enfrentar quatro horas de uma exasperante vigília a troco de nada, ao fim das quais ele completara um balanço catastrófico de sua existência e resolvera não acordar nunca mais. Em quatro horas sem sono, é possível fazer uma viagem de ida até o inferno e por lá ficar, ruminando ansiedades e coisas terríveis, antecipando a morte dos entes queridos e resgatando coisas que deviam ficar bem enterradas no passado, como brigas que nunca se resolveram, raivas represadas de gente que sumiu há tempos, coisas ouvidas e não compreendidas, tragédias, notícias ruins. Em quatro horas, dá para repassar os piores episódios da sua vida, na ordem, derretendo-se em dor de garganta, taquicardia e suor.
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