Acabei de ler Noites de alface, de Vanessa Barbara.
Adorei a linguagem dessa jovem autora. Sua
visão do mundo se dá de forma tão aguda que o real e o absurdo transformam-se
num par perfeito. Cativante, tocante, engraçado: esses são ótimos adjetivos
para o livro.
Pequeno fragmento do livro
Noites de alface...
Otto sempre tivera
dificuldade para pegar no sono, ao passo que Ada já caía no estágio REM antes
mesmo de pousar a cabeça no travesseiro. Insônia, para ela, era passar cinco
minutos rolando na cama, remoendo um crime hediondo que acabara de cometer. “Se
você matasse um inocente com uma tesoura sem ponta, tipo um negócio sangrento,
psicologicamente exaustivo, e tivesse que passar a vida enganando a polícia e
fugindo de um fantasma raivoso, ainda assim demoraria só uns vinte minutos para
dormir. No máximo”, argumentava o marido. Para Otto, insônia era enfrentar
quatro horas de uma exasperante vigília a troco de nada, ao fim das quais ele
completara um balanço catastrófico de sua existência e resolvera não acordar
nunca mais. Em quatro horas sem sono, é possível fazer uma viagem de ida até o
inferno e por lá ficar, ruminando ansiedades e coisas terríveis, antecipando a
morte dos entes queridos e resgatando coisas que deviam ficar bem enterradas no
passado, como brigas que nunca se resolveram, raivas represadas de gente que
sumiu há tempos, coisas ouvidas e não compreendidas, tragédias, notícias ruins.
Em quatro horas, dá para repassar os piores episódios da sua vida, na ordem, derretendo-se
em dor de garganta, taquicardia e suor.
.....
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