segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Amar é verbo intransitivo?




O amor é da ordem do encontro. Embora, como disse o poeta, existam tantos desencontros pela vida. É assim mesmo. Quem é que não tem uma história de desencontro para contar? Os desencontros acontecem sempre que topamos com a pessoa certa, na hora errada. A hora errada é o momento em que não temos disponibilidade ou amadurecimento, para experimentar um relacionamento com aquela pessoa que acabamos de conhecer e nos apaixonar. E, às vezes, é o outro que não está disponível para viver o amor.

Para algumas pessoas, é difícil admitir que a hora errada exista. Que os desencontros façam parte da experiência amorosa. Que algumas paixões germinam em solo árido, estéril e improdutivo. Não admitir a negatividade dessa experiência amorosa é partir para o sacrifício. Pois, para manter esse tipo de paixão é necessário muito sacrifício, muitas lágrimas, muita dor.

Parece absurdo pensar que a paixão pode acontecer num momento errado. Afinal, o amor é sempre visto como pura positividade: um bem em si mesmo. É quase como se nada pudesse dar errado, quando amamos e somos amados. Temos tanta fé nessa positividade, que esquecemos que o amor não tem lógica, que ele não pertence aos domínios da razão.

Por não ser lógico nem racional, ele é sempre uma experiência radical. Uma experiência que pode ser sublime ou devastadora. Que pode nos dar muitas alegrias, mas, também, nos fazer imensamente infelizes. O amor gera vidas, mas também mata. Não podemos negar essa dupla face do sentimento amoroso.

Quem insiste em pensar que toda paixão, só por existir, tem que dar certo; cai numa armadilha terrível. Expõe-se a sacrifícios absolutamente inúteis, transformando-se em vítima, ou em carrasco do amor. É esse tipo de pessoa que, ao experimentar o lado terrível do amor, passa a rejeitar esse sentimento. Não acredita mais no amor. Com medo de sofrer de novo, e sem coragem para dizer não aos encontros ruins, prefere abrir mão da experiência amorosa.

Maria Holthausen



sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Aprendendo a Viver com a Diferença




Menino com Down vira modelo de gigante britânica do varejo

Em um esforço para aumentar a diversidade de suas campanhas, uma loja de departamento britânica contratou um modelo com Síndrome de Down para promover sua linha de roupas infantis.

A campanha da gigante do varejo Marks & Spencer na realidade surgiu a partir da sugestão da mãe do novo garoto-propaganda da loja, Sebastian, de quatro anos.
Caroline Branco, da cidade de Bath, reclamou sobre a falta de diversidade nas propagandas que anunciam roupas e outros produtos para crianças na TV, revistas e outdoors.
Segundo ela, essa homogenização das campanhas publicitárias pode contribuir para aumentar o sentimento de isolamento de famílias que descobrem ter um filho com Síndrome de Down.
"Nós não sabíamos que Seb tinha Síndrome de Down quando ele nasceu e foi uma época muito assustadora, porque não estávamos preparados", disse Branco.
"Me lembro de ver todos aqueles anúncios na TV com famílias e crianças e não havia ninguém diferente, todo mundo era perfeito. Tudo isso só aumentou meu sentimento de isolamento e medo."

Uniformes

Segundo Branco, recentemente, quando Sebastian entrou na escola e ela teve de comprar uniformes para o filho, novamente lhe chamou a atenção a falta de diversidade nas campanhas publicitárias.
Foi por isso que ela fez a sugestão à Marks & Spencer, para que houvesse uma mudança na padronização dos modelos da loja - o que resultou na contratação do seu filho como garoto-propaganda.
"Espero que as pessoas percebam que vivemos como qualquer outra família. Seb canta, dança, encanta todo mundo", afirma Branco.
"Não quero que pensem que é uma tragédia (ter um filho com Síndrome de Down), porque a realidade está muito longe disso", completa.
A Marks & Spencer é a maior rede britânica de lojas de departamento. A cadeia tem mais de 700 lojas espalhadas pela Grã-Bretanha, além de ter presença em outros 40 países.

Fonte: Site BBC Brasil.


terça-feira, 18 de setembro de 2012

Isso é Desenvolvimento?



DEGRAUS DA ILUSÃO
Lia Luft

Fala-se muito na ascensão das classes menos favorecidas, formando uma “nova classe média”, realizada por degraus que levam a outro patamar social e econômico (cultural, não ouço falar). Em teoria, seria um grande passo para reduzir a catastrófica desigualdade que aqui reina.

Porém receio que, do modo como está se realizando, seja uma ilusão que pode acabar em sérios problemas para quem mereceria coisa melhor. Todos desejam uma vida digna para os despossuídos, boa escolaridade para os iletrados, serviços públicos ótimos para a população inteira, isto é, educação, saúde, transporte, energia elétrica, segurança, água, e tudo de que precisam cidadãos decentes.

Porém, o que vejo são multidões consumindo, estimuladas a consumir como se isso constituísse um bem em si e promovesse real crescimento do país. Compramos com os juros mais altos do mundo, pagamos os impostos mais altos do mundo e temos os serviços (saúde, comunicação, energia, transportes e outros) entre os piores do mundo. Mas palavras de ordem nos impelem a comprar, autoridades nos pedem para consumir, somos convocados a adquirir o supérfluo, até o danoso, como botar mais carros em nossas ruas atravancadas ou em nossas péssimas estradas.

Além disso, a inadimplência cresce de maneira preocupante, levando famílias que compraram seu carrinho a não ter como pagar a gasolina para tirar seu novo tesouro do pátio no fim de semana. Tesouro esse que logo vão perder, pois há meses não conseguem pagar as prestações, que ainda se estendem por anos.

Estamos enforcados em dívidas impagáveis, mas nos convidam a gastar ainda mais, de maneira impiedosa, até cruel. Em lugar de instruírem, esclarecerem, formarem uma opinião sensata e positiva, tomam novas medidas para que esse consumo insensato continue crescendo – e, como somos alienados e pouco informados, tocamos a comprar.

Sou de uma classe média em que a gente crescia com quatro ensinamentos básicos: ter seu diploma, ter sua casinha, ter sua poupança e trabalhar firme para manter e, quem sabe, expandir isso. Para garantir uma velhice independente de ajuda de filhos ou de estranhos; para deixar aos filhos algo com que pudessem começar a própria vida com dignidade.

Tais ensinamentos parecem abolidos, ultrapassadas a prudência e a cautela, pouco estimulados o desejo de crescimento firme e a construção de uma vida mais segura. Pois tudo é uma construção: a vida pessoal, a profissão, os ganhos, as relações de amor e amizade, a família, a velhice (naturalmente tudo isso sujeito a fatalidades como doença e outras, que ninguém controla). Mas, mesmo em tempos de fatalidade, ter um pouco de economia, ter uma casinha, ter um diploma, ter objetivos certamente ajuda a enfrentar seja o que for. Podemos ser derrotados, mas não estaremos jogados na cova dos leões do destino, totalmente desarmados.

Somos uma sociedade alçada na maré do consumo compulsivo, interessada em “aproveitar a vida”, seja o que isso for, e em adquirir mais e mais coisas, mesmo que inúteis, quando deveríamos estar cuidando, com muito afinco e seriedade, de melhores escolas e universidades, tecnologia mais avançada, transportes muito mais eficientes, saúde excelente, e verdadeiro crescimento do país. Mas corremos atrás de tanta conversa vã, não protegidos, mas embaixo de peneiras com grandes furos, que só um cego ou um grande tolo não vê.

A mais forte raiz de tantos dos nossos males é a falta de informação e orientação, isto é, de educação. E o melhor remédio é investir fortemente, abundantemente, decididamente, em educação: impossível repetir isso em demasia. Mas não vejo isso como nossa prioridade.

Fosse o contrário, estaríamos atentos aos nossos gastos e aquisições, mais interessados num crescimento real e sensato do que em itens desnecessários em tempos de crise. Isso não é subir de classe social: é saracotear diante de uma perigosa ladeira. Não tenho ilusão de que algo mude, mas deixo aqui meu quase solitário (e antiquado) protesto.

Fonte: Revista Veja

Culturas Diferentes Promovem Diferentes Perspectivas




O que há por trás da alta taxa de estupro na Suécia?

Ruth Alexander
BBC

A possível extradição do fundador do WikiLeaks, Julian Assange, do Reino Unido à Suécia, chamou atenção recentemente para a alta taxa de estupros do país escandinavo, considerado um dos mais seguros do mundo. Mas até que ponto as estatísticas suecas podem ser comparadas com as de outras nações?

O comparativo internacional de dados sobre criminalidade é, muitas vezes, questionável, algo já sabido por criminalistas e estatísticos, mas ainda desconhecida em grande parte por jornalistas e pelo público em geral.

De fato, a polícia sueca registrou, em 2010, o maior número de casos de delitos sexuais - 63 por 100 mil habitantes - em relação a qualquer outro país na Europa. Trata-se da segunda maior taxa do mundo.

Naquele ano, a incidência desse tipo de crime na Suécia foi três vezes maior do que a vizinha Noruega e o dobro da taxa dos Estados Unidos e do Reino Unido.
Além disso, também foi 30 vezes maior do que a Índia, que registrou somente dois crimes por 100 mil habitantes.

À primeira vista, portanto, a Suécia pareceria um país mais perigoso de se morar do que outras nações do mundo.

Mas, no fim das contas, trata-se de uma visão errada da realidade, segundo Klara Selin, socióloga do Conselho Nacional para a Prevenção de Crime em Estocolmo.

Ela afirma que não se pode comparar as estatísticas de cada país, porque os procedimentos policiais e as definições legais dos crimes são muito elásticas.
"Na Suécia, há uma vontade explícita de registrar todo caso de delito sexual separadamente, para torná-los visíveis nas estatísticas", afirmou.

"Assim, por exemplo, quando uma mulher vai à polícia e diz que seu marido ou namorado a estuprou quase todo dia no ano passado, a política tem de registrar todos esses delitos, um por um separadamente. Assim, seriam, nessa hipótese, 300 'casos' de estupro apenas para uma única vítima. Em outros países, esse mesmo caso é registrado apenas uma vez - uma vítima, um tipo de crime, um registro", explicou.

Como resultado, o número de estupros relatados tem crescido na Suécia - o número triplicou nos últimos sete anos. Em 2003, cerca de 2,2 mil delitos sexuais foram registrados pela polícia, comparado a quase 6 mil em 2010.

Mas, para Selin, as estatísticas não representam uma grande epidemia do crime no país, e sim, uma mudança de atitudes.

O debate público sobre esse tipo de delito na Suécia nas últimas duas décadas teve como efeito, afirmou Selin, o aumento da conscientização pública, encorajando as mulheres a prestar queixa na polícia quando atacadas.

A polícia também tem concentrado esforços em melhorar a apuração dos casos, diz Selin, ainda que o número tenha, de fato, aumentado - uma preocupação levantada no relatório da Anistia Internacional em 2010.

"É provável que tenha havido um aumento do crime por causa das mudanças da sociedade. Devido à internet, por exemplo, hoje é muito mais fácil encontrar alguém, praticamente na mesma noite em que você navega. Além disso, o consumo de álcool aumentou bastante nesse período", diz Selin.

"Mas a explicação que melhor cabe nesse caso é que as mulheres estão prestando mais queixas, e também porque em 2005 houve uma reforma na legislação de crimes sexuais, o que ampliou a definição legal do estupro", acrescentou.

Segundo o novo código, casos em que as vítimas de estupro estavam adormecidas ou intoxicadas são agora incluídos nas estatísticas. Anteriormente, tais condições eram tipificadas em qualquer categoria de crime, não necessariamente estupro.

Equívoco

Nesse sentido, uma comparação internacional de estatísticas criminais pode ser enganosa.

Botsuana, no oeste da África, possui, atualmente, o maior número de estupros - 92,9 por cada 100 mil habitantes - mas um total de 63 países não submetem suas estatísticas, incluindo a África do Sul, onde uma pesquisa conduzida há três anos mostrou que um a cada quatro homens já admitiram ter estuprado uma mulher no país.

Em 2010, o relatório da Anistia Internacional destacou que a violência sexual ocorre em todos os países do mundo, apesar de estatísticas oficiais revelarem que a incidência desse tipo de crime em nações como Hong Kong ou Mongólia é zero.
Além disso, dependendo do país, as mulheres são menos suscetíveis a registrar um ataque e, em outros, nem conseguem formalizá-lo junto às delegacias competentes.

Enrico Bisogno, especialista em estatística das Nações Unidas, afirma que as pesquisas revelam que apenas um em cada dez casos é registrado na polícia, em muitos países do mundo.

"Nós sempre usamos a metáfora do iceberg para explicar essa situação. O que podemos ver é somente a ponta dele, enquanto que há uma imensidão que se estende abaixo do mar, ou seja, fora do radar das agência que fiscalizam o cumprimento da lei", diz.

Condenações

O mesmo equívoco que se aplica aos casos de estupro também pode ser observado no índice de condenações.

De fato, quando se analisam as taxas de condenações do país sobre o número de delitos registrados nas delegacias de polícia ou sobre o número total de sentenças proferidas, a conclusão inicial é de que a impunidade na Suécia seria maior do que em outras nações europeias.

Porém, a mesma confusão estatística volta à tona. Na Suécia, vários delitos cometidos por uma única pessoa são registrado separadamente, elevando - em muito - a conta final.

As Nações Unidas possui estatísticas oficiais sobre o número de condenações por estupro a cada 100 mil habitantes e, na prática, sob tal prisma, a Suécia possui o maior porcentual de condenações per capital na Europa. Em 2010, foram 3,7 condenações a cada 100 mil habitantes.

Dessa forma, a análise dos dados não pode prescindir de um trabalho minucioso de detalhamento dos dados que nem sempre relevam tão facilmente a situação de um país comparado aos demais.

O estupro é particularmente mais complexo, uma vez que, na maioria das vezes, depende das queixas feitas pelas mulheres, não sendo possível totalizar o número de mortos como em outros crimes e, assim, permitir a comparação.

"Por exemplo, se eu dou um soco em alguém e essa pessoa eventualmente morre, alguns países podem considerar que se trata de homicídio doloso (com intenção de matar); outros, culposo (sem intenção de matar). Ou, em outros países, o próprio latrocínio (roubo seguido de morte) é tipificado em separado, seguindo um código penal diferente dos demais crimes", afirmou Bisogno.

FONTE: SITE BBC BRASIL


segunda-feira, 17 de setembro de 2012

A ordem é inventar




Durante um longo tempo, os estudos de gênero foram realizados quase que exclusivamente por pesquisadoras feministas, passando, nos últimos anos, a despertar o interesse de pesquisadores não militantes como antropólogos, sociólogos e historiadores renomados.

Por consequência, as questões se diversificaram e as perspectivas de observação e pesquisa se multiplicaram, transformando os estudos de gênero num consistente campo de produção de saber.  Advém dessa área de pesquisa a constatação de que o modelo patriarcal do “homem” e da “mulher”, já não sustenta as novas identidades. Na sociedade contemporânea, dizem esses pesquisadores, não existe a possibilidade de eleger um único modelo que sirva como referência para todos.

No campo da feminilidade, acompanhamos, pessoalmente ou através das narrativas históricas, o movimento feminista na luta pela desconstrução dos arquétipos tradicionais da construção do feminino. Nos últimos anos, a mulher mudou. Como disse um amigo outro dia: “Hoje, elas querem tudo. É difícil achar uma mulher que simplesmente queira ser mãe e esposa.”

No campo da masculinidade, o modelo de homem, produzido pela sociedade patriarcal, vem sendo tão questionado que foi obrigado a abrir espaços para outras masculinidades mais flexíveis e plurais. Algo que era visto como natural - “o poder do macho” - passou a ser seriamente problematizado.

A identidade masculina passou de uma inflexibidade poderosa para uma participação interativa flexível. No modelo tradicional, o homem era visto como alguém forte e firme em suas decisões, inflexível em sua vontade pétrea, machista e egoísta. Nesses novos tempos, mais importante que dar ordens é convencer e seduzir; melhor que ser sempre igual, é mostrar-se criativo, respondendo diferentemente, conforme o aspecto de cada circunstância.

Hoje, sem o modelo fixo, que assegure a identidade, alguns homens se sentem mais a vontade para experimentar novas vivências afetivas.  Outros reagem atordoados, procurando novas formas de ser que lhes devolvam a segurança perdida. Para isso, hipertrofiam os traços machistas em academias, fabricam abdomens tanquinhos, ao mesmo tempo em que vão perdendo a vergonha de confessar seu interesse nos melhores cremes, na cirurgia plástica e nas mais fascinantes e eletrizantes combinações de roupa. 

Concluindo. No mundo pós-moderno tornou-se obsoleto o debate maniqueísta: Homem x Mulher.

Maria Holthausen

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Relacionamento Homoerótico: Um Novo Modelo de Família




Falar da família contemporânea é falar das mudanças que essa instituição civil vem incorporando desde os meados do século passado. Se antes, os laços familiares eram formados apenas por critérios patrimoniais e biológicos, hoje, o elemento unificador da constelação familiar é o afeto. As famílias se formam através dos vínculos de amor e afeição. Estes, sim, são os verdadeiros elementos solidificadores da união familiar.

A família homoerótica, homoafetiva ou homoparental, é uma das várias formas da família contemporânea. Ela parte da união, por vínculo de afeto e desejo sexual, entre pessoas de mesmo sexo. Uma união que, embora aprovada pelo código civil, ainda sofre as consequências de muitos preconceitos.

Talvez, um dos maiores preconceitos, vividos hoje pelos casais homoeróticos, é o da adoção de crianças. Teme-se, por exemplo, que crianças adotadas por esses casais sofram a intolerância e, muitas vezes, o ódio irracional da sociedade pela opção de seus pais adotivos. Diz-se: - “Essas pessoas não estão levando em conta o sofrimento, causado na criança, pelo preconceito que pesa sobre os seus pais.”

Não sou ingênua, acredito que essas crianças viverão, sim, uma série de situações preconceituosas e terão que aprender a conviver com elas. Mas, por causa do preconceito, não podemos duvidar do direito desses casais de adotarem suas crianças. Muitas outras crianças sofrem com o preconceito social: as negras, as gordinhas ou muito magrinhas, as que nasceram com alguma diferença física ou emocional, e assim por diante.

A maioria dos adultos sofreu algum tipo de preconceito na infância e teve que aprender a conviver com eles. E afinal, muito mais importante que o preconceito é o afeto, a educação e a segurança que os casais homoparentais podem oferecer a uma criança que vive em um abrigo institucional. Crianças precisam de dedicação, cuidado, respeito e amor, precisam de alguém que lhe dê condições para crescer de maneira saudável, tendo seus direitos e deveres observados e respeitados. Nenhum abrigo, por melhor que seja, pode oferecer essas condições.

Portanto, se nos preocupamos com o preconceito que essas crianças podem vir a sofrer, temos que arregaçar as mangas e começar a colocar um basta no preconceito. O erro é o preconceito, não esse modelo de adoção. As escolas precisam estar mais preparadas para lidar com as novas formas de famílias. Assim como todos os profissionais que trabalham nas várias etapas do processo de adoção.  

Maria Holthausen

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Pragmáticos versos Românticos




Para o escritor irlandês, Oscar Wilde, o mundo está povoado por dois tipos de pessoas. Os cínicos, aqueles que sabem o preço de tudo, mas não conhecem o valor de nada. E os sentimentais, aqueles que reconhecem um valor incomensurável em tudo, mas não sabem o preço de nada.

Abrindo mão da ironia do autor, podemos, também, dividir a espécie humana em duas classes: os pragmáticos e os românticos. Chamaremos de pragmáticos, aquelas pessoas que sabem o preço, por exemplo, da sua casa no mercado imobiliário. Mas, dificilmente conseguem estabelecer um vinculo afetivo com ela. E de românticos, aqueles que estabelecem primeiro um vínculo afetivo com a casa. O valor de mercado, para eles, tem pouca influência na relação afetiva que mantem com a casa.

Sem a carga moral da ironia, podemos supor que essa perspectiva define, apenas, duas maneiras diferentes de se relacionar com o mundo. Os pragmáticos são menos afetivos, mais “pé no chão”. Os românticos são mais afetivos, vivem “nas nuvens”. 

Geralmente, os homens são mais pragmáticos e as mulheres mais românticas. Se a dose do romantismo de um e do pragmatismo do outro é pequena, forma-se uma bela dupla. Ele pode apreciar o modo como ela se relaciona afetivamente com o mundo a sua volta. E ela se sente segura por saber que seu parceiro mantém os pés bem firmes no chão. E no caso de ele ser o mais romântico, mais sonhador. É ela que pode manter os projetos do casal amarado em bases sólidas.

No entanto, quando a lógica matemática domina todos os interesses de um dos parceiros, e a lógica poética domina o comportamento do outro, a convivência diária pode ficar bem complicada. Com visões de mundo tão diferentes, a tendência de conflito, em cada decisão do casal, é muito grande. Geralmente, o pragmático mantém com mão de ferro suas decisões. Dentro da lógica do mercado, suas escolhas sempre serão vistas com mais coerência. O outro, o romântico, será interpretado como muito sonhador. E, portanto, não merece ser levado a sério.

Para que o relacionamento se mantenha, o sonhador se inibe, passa a não expressar mais suas ideias. Abre mão de seus sonhos e de seus desejos. Não porque esses sonhos e desejos não tenham valor, mas porque o seu parceiro só sabe ver preços, não sabe dar valor.
 
Maria Holthausen