segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Narciso no país da solidão


No esforço diário de estabelecer um lugar no mundo, cada um de nós se alimenta de duas fontes essenciais. Na primeira, encontramos as aspirações, as normas e os ideais transmitidos pelo discurso paterno. Na segunda, o amor incondicional da mãe que nos acolheu e agasalhou nos primeiros anos de vida. Ou seja, nossas fontes são a lei paterna e o amor materno.

No entanto, na sociedade contemporânea, bebemos sobretudo da segunda fonte: o amor materno. Por isso, somos tão narcísicos. Estamos muito mais preocupados em sermos amados, aplaudidos e admirados, do que com os deveres e princípios. “Narciso é o mito de uma humanidade sem interdito e fascinada pelo poder ilimitado de seu eu.”

Como crianças, sapateamos sempre que nossos desejos não são imediatamente atendidos. Não queremos, ou melhor, não sabemos mais esperar por nada. Temos pressa, tudo é urgente. Devoramos tudo rapidamente. Não sabemos mais lidar com as frustrações, elas nos causam angústia. Aquela velha noção de tempo que aprendemos com a natureza - tempo para plantar, tempo para crescer, tempo para colher -; hoje não faz mais sentido. Tudo tem que ser resolvido num clic.

O estranho é que esse sentimento de urgência, de querer tudo e de acreditar que podemos fazer tudo, acaba provocando muita solidão. Temos milhares de amigos no faceboock. Saímos com centenas de colegas. Temos relações sexuais com dezenas de parceiros, mas, no “fim da noite”, continuamos nos sentido sozinho, porque os laços afetivos com todas essas pessoas são muito frágeis e superficiais.

Não temos mais fôlego para sustentar os projetos de longo prazo. Tudo nos cansa rapidamente. Tal como narciso, nossa imagem é líquida. Nosso rosto pode ter muitas formas e, simultaneamente, forma nenhuma. Substituímos o peso da tradição pelo deleite do culto a “si-mesmo”, e a punição da lei pelo cuidado terapêutico.


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