domingo, 9 de março de 2014

Ainda o Segundo Sexo




Fragmento do livro O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir, escrito em 1949. Como podemos concluir através do texto, o projeto de vida  das mulheres não mudou muito nesses últimos 65 anos.


Hoje o casamento conserva em grande parte esse aspecto tradicional. E, antes de tudo, impõem-se muito mais imperiosamente à jovem do que ao jovem. Há ainda importantes camadas sociais em que nenhuma outra perspectiva se propõe a ela; entre os camponeses a celibatária é um pária; fica sendo a serva do pai, dos irmãos, do cunhado; o êxodo para as cidades não está a seu alcance; o casamento, escravizando-a a um homem, faz dela dona do lar. Em certos meios burgueses ainda se deixa a moça na incapacidade de ganhar a vida; ela só pode vegetar como um parasita no lar paterno ou aceitar uma posição subalterna em algum lar estranho. Mesmo nos casos em que ela é mais emancipada, o privilégio econômico detido pelos homens incita-a a preferir o casamento a um ofício: ela procurará um marido de situação superior à sua própria, esperando que ele “vença” mais depressa, vá mais longe do que ela seria capaz...
É natural que (ela) seja tentada por essa facilidade tanto mais quanto os ofícios femininos são muitas vezes ingratos e mal remunerados; o casamento é uma carreira mais vantajosa do que muitas outras...
Numerosas norte-americanas conquistaram sua liberdade sexual, mas suas experiências assemelham-se às dos jovens primitivos descritos por Malinowsky, que gozam na Casa dos Celibatários prazeres sem consequências; espera-se deles que se casem, e é somente então que são encarados como adultos. Uma mulher só, na America do Norte, mais ainda do que na França, é um ser socialmente incompleto, ainda que ganhe sua vida; cumpre que traga uma aliança no dedo para que conquiste a dignidade, integral de uma pessoa e a plenitude de seus direitos. A maternidade, em particular, só é respeitada na mulher casada; a mãe solteira permanece um objeto de escândalo e o filho é para ela um pesado handicap. Por todas essas razões, muitas adolescentes do Velho e do Novo Mundo, interrogadas acerca de seus projetos de futuro, respondem hoje como o teriam feito outrora: “Quero casar-me”.

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